O vídeo foi o mais bonito, detalhado e chocante de toda a E3 2013. É o retorno de Big Boss, que na complicada linha do tempo da série Metal Gear Solid, continua ganhando tanto carisma quanto Solid Snake, um clone dele.

O início não é para os fracos: Kojima referencia a genialidade única de Stanley Kubrick e mistura músicas calmas, melodiosas e lindas, com cenas bárbaras, revoltantes. Um soldado gira a manivela de um gerador para poder eletrificar dois bastões… e praticamente fritar o pescoço de uma mulher anônima. A cena é tão impactante que a câmera se afasta, foca o chão, gera estática. Não existe contexto ao ato: não sabemos o que a Anônima fez, quem é o soldado, mas a cena é cortada por um par de botas famoso para os fãs de Metal Gear Solid. É Ocelot. Por um segundo temos um vislumbre quase automático, inconsciente de toda a situação, temos uma prévia, uma separação de quem são os Caras Maus. A Anônima instantaneamente se torna uma Mocinha, Vítima, torrada logo numa das regiões mais frágeis do corpo.

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É nesse tipo de sutileza que reside o gênio de Kojima, capaz de pulverizar frames quase imperceptíveis com uma dose de poesia subjetiva que nos atinge de forma única. Capaz de criar personagens tão realistas quanto únicos.

As cenas são cortadas por frases de efeito, que reforçam que o que move os atos da maioria dos personagens desse game não é nada típico do que repousa nos campos de batalha – nada de bandeiras ou ideologias. Crianças africanas seguram armas com quase o tamanho delas. Estamos diante de um videogame, mas a estranha beleza dos gráficos não deixa escapar a expressão de inocência devorada das crianças, com seus movimentos desengonçados, sem a firmeza que um fuzil de assalto exige.

A música continua: lenta, torturante.

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As crianças dão lugar a um prisioneiro com capuz na cabeça, que poderia ser qualquer dos aprisionados sem qualquer julgamento em Guantánamo. Ou ainda aqueles que serviram como brinquedos para a psicopatia com a benção do Estado de soldados americanos em Abu Ghraib. Um soldado joga água na cara do prisioneiro – o afogamento gera pânico e derruba a resistência, e não por acaso é um dos métodos favoritos de tortura das Forças Especiais americanas. Coronhada no meio do estômago: outra forma de deixar uma pessoa sem ar. O prisioneiro toma um tiro pelas costas, como um vira-lata inglório: permaneceu anônimo, sem história, passado ou ligações com o mundo. Só um cara com uma camisa amarela, agora banhada de sangue.

Kojima não nos poupa nessa versão Director’s Cut do trailer de Metal Gear Solid V: The Phantom Pain. São meros quatro minutos a mais, que mostram que não haverá concessões ali. Metal Gear Solid possui um tom de meta-realidade: utiliza conceitos geopolíticos avançados, e os mescla com um pouco de narrativas sobrenaturais e metalinguagem. Dentro do roteiro dos games da série estão devidamente no lugar a Realidade, o papel dos games como Arte, e Você, controlando tudo como um deus fajuto que não tem qualquer poder de mudar o destino dos personagens. Acima de tudo isso está Kojima, que com plena consciência das capacidades que possui para levar seus games a um nível quase inalcançável de qualidade.

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Metal Gear Solid V corajosamente rompe com alguns paradigmas da série: possui um mundo aberto e menos cenas CG. Provavelmente agora não mais soará como um filme interativo, como certos momentos da série, com suas cenas de mais de uma hora de duração. O trailer ainda mostra algumas novidades que fizeram os fãs arrancarem os cabelos: novas técnicas stealth (se esconder na lateral do cavalo enquanto cavalga é uma delas), mudanças climáticas em tempo real (espere tempestades de areia tsunâmicas), combates mais realistas, “vários modos de transporte”, e estratégias furtivas renovadas.

A alardeada Fox Engine parece cumprir o que promete e deixa Big Boss com movimentos realistas, a poeira do Afeganistão (as paisagens desérticas do país parecem tão convidativas quanto as florestas soviéticas) assustadoramente agressivas. MGS V é um jogo bonito, em resumo. Acolhedoramente bonito, sem precisar de malabarismos ou qualquer tipo de enganação. Se Phantom Pain for o último game da série, a apoteose narrativa que ele demonstra tornará tudo inesquecível.

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A música brega clássica da série aumenta o volume, servindo como trilha de luxo para Big Boss invadir uma base inimiga para encontrar Kaz, amarrado e ferido. O trailer caminha para seus movimentos finais. Na cabeça, acende a certeza de mais uma obra-prima – em suas mecânicas, em sua narrativa – para o ano que vem.

Kojima pode ser um gênio de uma franquia, mas é indiscutível o cuidado meticuloso que ele tem com sua cria.

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