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[ARTE DA VITRINE]: Thiago Chaves (@chavespapel)
Texto publicado originalmente em duas partes no: Nerdevils

O Papa é pop.
O Papa é pop.
O Pop não poupa ninguém” – Engenheiros do Havaii (O Papa é Pop)

Robert Crumb havia autografado muito mais do que os 40 livros previamente acertados e, mesmo assim, a fila de fãs ávidos por uma assinatura não dava sinais de diminuir. Então, em um movimento no mínimo inesperado para alguém com 70 anos, Crumb subiu na cadeira, pendurou-se no corrimão da escada atrás dele e foi ao banheiro, só saindo quando tinha certeza de que não encheriam mais o seu saco. A esta altura eu já estava em uma lanchonete na Cardeal Arcoverde com outros nerds falando merda, comendo pizza, bebendo cerveja e rindo de piadas que ninguém de fora daquela mesa poderia entender. Em certos momentos eu tinha pena da pobre moça que nos atendia.

Crumb e Gilbert Shelton vieram para o Brasil participar da Festa Literária Internacional de Paraty (FLIP) e deram uma passada na Livraria da Vila para um bate-papo com seus fãs. Fiquei realmente empolgado com o evento ao saber que Caco Galhardo seria o mediador da mesa. Meu real objetivo era conseguir um autógrafo dele e não do Crumb. Então, antes de sair para o trabalho enfiei na mochilla um exemplar de “Zap Comix” e o álbum “You have been desconected” e aproveitei para reler no caminho.

Como saio de São Mateus às 18h e o evento começava às 19h, é claro que cheguei atrasado. Encontrei alguns amigos no Metrô Clínicas e lá fomos nós. A livraria estava abarrotada de gente e só consegui ver o Crumb de costas e um teco da barba do Shelton. Pelo menos dava pra ouvir direito as perguntas e respostas.

O que eu não entendo é como alguém faz um evento em um lugar que, obviamente, não tinha a mínima estrutura para suportar decentemente metade do público que compareceu. Eu mesmo estava em uma escada atrás da mesa e esta maldita escada era a entrada para os jornalistas cadastrados, VIPs e pessoas bonitas, de modo que a todo momento eu tinha que tentar arrumar espaço para alguém passar e levava um empurrão do segurança. O banheiro ficava depois da mesa e do público, então qualquer um que quisesse se aliviar acabaria fazendo no caminho. Podem alegar que é propaganda para a livraria, mas duvido que 10% de quem estava lá tenha comprado algo e aposto que os habitués adoraram ver o lugar invadido.

(Um funcionário comentou que existem unidades maiores da Livraria da Vila, mas parece que o público nelas é fresco e gasta o suficiente para vetar eventos do tipo)

Fonte: Estadão

Deu para perceber que Crumb e Shelton estavam mais à vontade do que na FLIP (talvez porque desta vez suas esposas estivessem longe) e é incrível como o o criador dos Freak Brothers não se incomodou em ficar à sombra de seu companheiro. Todas as perguntas eram feitas para o Crumb e depois o Shelton dizia sua opinião. Mais de uma vez esqueceram que ele estava lá e alguém do público gritava “O Shelton não respondeu!”.

Mas o que realmente me surpreendeu foi o imenso número de cosplayers do Robert Crumb. Já trabalhei em duas bienais do livro, duas festas do livro na USP, 4 Fest Comix. Já trabalhei dois anos em uma comic shop em plena Rua Augusta. E em nenhuma dessas ocasiões eu vi um único ser com o visual parecido com o do “papa do underground”. Já lá na Livraria da Vila eu contei pelo menos uns 9 sujeitos vestidos lá Crumb, sendo um deles inclusive famosinho no meio das HQs nacionais. Patético, para ser minimamente educado.

O evento estava legal até começarem as perguntas do público. Salvo algumas exceções, a maior parte das perguntas foi péssima. Pior era quem achava que sabia falar inglês e perguntava para os dois direto, aí os gringos não entendiam e o cara tinha que fazer a pergunta de novo em português para o intérprete traduzir no inglês correto. Vergonha alheia total. A coisa tava tão feia que acabei indo conversar com outros caras de saco cheio ali pela livraria. Acabei encontrando alguns conhecidos do ramo. Falamos mal da Panini, trocamos cartões, o de sempre.

Finalmente acabou a sessão de perguntas e eles iam começar a autografar os livros. Encontrei uma amiga que trabalhava em uma editora presente ali e fomos falar com o Galhardo. Com a galera se matando pra conseguir relar um dedo no Crumb e no Shelton, foi fácil chegar no autor de “Os Pescoçudos”, trocar uma idéia e conseguir meu tão esperado autógrafo. Com a missão pessoal cumprida, saí da livraria, encontrei o resto do povo e então vinha a busca mais difícil de todas: achar um lugar barato para comer na Vila Madalena.

Shelton, Galhardo e Crumb
Shelton, Galhardo e Crumb

Após andar alguns quarteirões desistimos de procurar um lugar barato e passamos a procurar um lugar aparentemente sujo, assim pelo menos nos sentiríamos mais à vontade. Por fim, achamos uma lanchonete com cara de boteco e resolvemos repor nossas energias na base de pizza e cerveja.

Uma questão de ética mesquinha me impede de citar nominalmente todos os presentes, mas basta saber que, além dos seres bizarros que compõe meu círculo de amizade, estavam na mesa o editor e um colaborador de uma famosa revista nacional de humor e um resenhista de um dos maiores sites nacionais de HQ. Digo que omito nomes por ética mesquinha porque, em certo momento, foram ditas coisas “não-muito-legais” sobre chefes, linhas editoriais, políticas salariais e afins e não quero ser responsável pela demissão de ninguém. Como dizem por aí: “O que acontece na estrada morre na estrada”. Mas também houve muito bate-papo sobre nerdices em geral: RPG, card-games, videogames e por aí vai…

Não me lembro o porquê, mas perto da hora de ir embora o assunto “Scott Pilgrim” tomou conta da mesa. Uns elogiavam o aspecto divertido da obra, outros a achavam desnecessariamente arrastada em alguns momentos e rápida demais em outros. Foi quando o Shinkoheo soltou a frase que acabou com a discussão: “Scott Pilgrim é tudo o que a Turma da Mônica Jovem deveria ter sido”.

A esta altura o relógio já marcava 23 horas e o receio de ficar sem condução para ir para casa nos obrigou a pedir as contas e irmos embora. Para quem não sabe 23 é um número sagrado para os Discordianos. Isso porque 2+3=5 e uma vez que todo os números são multiplicáveis e divisíveis por 5, este número é sagrado e foda-se.

(OBS: O QUE? Você acredita em um homem andava sobre as águas, curava as pessoas com cuspe, multiplicava pães e peixes e vem questionar o porquê do 23 ser sagrado? Vai levar um mindfuck ainda hoje e tenha certeza de que a culpa vai ser minha. FNORD)

O que importa foi a partir dessa hora as coisas começaram a ficar estranhas. Em certo momento rolou esse diálogo entre eu e um dos caras presentes.

Ele – Tá foda, cara. Tô sendo atacado por succubus, inccubus e coisas do tipo.

Eu – Hã? Como assim?

Ele – Tipo assim, eu aprendo rápido e tal, aí fui convidado pra participar da maçonaria, rosa-cruz, essas coisas…

Eu – Sei bem como é. Mas o que isso isso tem a ver?

Ele – Bom, eu recusei. E também comecei a andar com um pessoal da IOT, saca? E eu falo pra caralho, sou todo simpaticão e tal e acho que rolou meio que inveja e estão me atacando. Sabe como eu me defendo?

Eu – Cara, até sei, mas não ensino. Digo isso porque quando você começa com essa de “aprender pra se defender” acaba caindo nessa nóia de ataque e defesa e qualquer coisa passa a ser ataque você tá a toda hora tendo que se defender e logo tá atacando também e então tá tretando mais que a galera das casas comunais do Harry Potter.

Ele – Mas cara, tô a quase duas semanas sem dormir direito e tal, eu preciso de alguma coisa.

Eu – Hum… Olha, faz um ritual de banimento pra limpar as energias ao seu redor. A maioria dos “ataques” que essa galera faz não não ultrapassam um banimento bem feito. Usa o Ritual Menor do Pentagrama, é baba.

Ele – Mas eu não curto esse lance de usar nome de anjos e tal.

Eu – Então usa o Ritual Gnóstico do Pentagrama. É praticamente igual, só usa chakras, visualizações de cores e entoação de mantras. Mas neutro que isso não dá, hehehehe…

Ele – Acho que já vi isso no Morte Súbita. Vou caçar.

Eu – E quando for sair de casa faça o Ritual do Círculo Branco. Simplesmente medite sobre coisas boas, proteção, essas tipo de pensamentos positivos… Então trace um circulo de luz branca ao seu redor e saia tranquilo de casa. Aprendi isso quando ia na Rosa-cruz. É simples, mas funciona legal.

Mais tarde  estava voltando com o Mário para casa e comentávamos sobre como era engraçado o fato do Crumb ter vindo pra São Paulo para essa galera massa poder se reunir. Essas manipulações que só o acaso torna viáveis. Ao mesmo tempo é uma merda ter que esperar algum evento escalafobético desses ao invés de simplesmente sair e dane-se. Foram feitas promessas vãs de tentar fazer isso com mais frequência e todos se recolheram aos seus Bolsões um pouco mais felizes.

“Você acabou de transformar os dez últimos minutos de nossas vidas em uma cena do Tarantino.” – King Mob, “Os Invisíveis – Infernos Unidos da América”

PS: Horas depois conversei com o rapaz que estava com aqueles problemas todos via MSN ele disse que fez os ritos sugeridos e que haviam dado certo. Ele finalmente ia ter uma noite de sono decente.

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