Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+ Compartilhar no Tumblr No início dos anos 2000 a Marvel enfrentava um problema: sua cronologia era muito complicada para novos leitores. Os roteiristas trabalhavam as histórias sem a preocupação de angariar novos fãs e sim de agradar os antigos. Fazer um reboot era algo fora de questão, pois a experiência mais próxima disso foi um fracasso retumbante que aconteceu anos antes (alô Heróis Renascem). O então presidente da Marvel, Bill Jemas, e o então editor-chefe, Joe Quesada, encontraram a solução perfeita para o problema: criar um novo selo, com seu próprio universo reinventando os heróis da editora. Assim nascia o Universo Ultimate. Quesada e Jemas trataram de procurar escritores jovens e sem os vícios dos roteiristas já antigos. Ambos buscaram Brian Michael Bendis dos quadrinhos indies e arrancaram Mark Millar da Wildstorm (então ainda viva na DC Comics). A proposta do universo era simples: atualizar os personagens para o século XXI e atrair novos leitores. Bendis era um escritor então desconhecido do grande público, mas que fazia um sucesso enorme no underground com obras como Jinx, A.K.A. Goldfish e Torso. Por recomendação de Joe Quesada o escritor foi contratado por Bill Jemas com uma ingrata missão: reescrever talvez a origem mais simples dos quadrinhos, a do Homem-Aranha. Ultimate Spider-Man #1 Em Outubro de 2000 chegou as comic shops americanas Ultimate Spider-Man #1, com roteiros de Bendis e com arte do veterano Mark Bagley, que já havia trabalhado durante anos no personagem. O escritor transformou Amazing Fantasy #15 com suas 11 páginas de origem em um arco em 7 partes e com Peter Parker virando o Homem-Aranha apenas na QUINTA edição. O sucesso foi estrondoso, com a revista Ultimate vendendo mais que a encarnação 616, a popular The Amazing Spider-Man. A origem do personagem foi mantida na sua essência, com Peter Parker sendo um boboca jovem, sem jeito com mulheres, zoado por outros adolescentes e que sempre contava com o amor dos seus tios para superar qualquer problema. Bendis espertamente atualizou o personagem: Parker agora foi picado por uma aranha geneticamente modificada em vez de uma aranha radioativa. O personagem não era um fotógrafo sem experiência que conseguiu um emprego em um grande jornal mas sim um webmaster. Outros personagens sofreram alterações: Gwen Stacy era uma jovem rebelde que tinha problemas de relacionamento com seu pai, Tia May não era uma velha chata e indefesa e sim uma mulher entrando na casa dos 50 com atitude e por aí vai. Com o sucesso de Ultimate Spider-Man a Marvel não tardou em expandir o universo, e em fevereiro de 2001 veio Ultimate X-Men de Mark Millar e Adam Kubert. O roteirista escocês pegou os jovens obedientes e certinhos dos anos 60 e os transformou em um grupo com hormônios a flor da pele, que não abaixavam a cabeça para o Professor Xavier tão fácil. Ultimate X-Men (cover 85 to 88) Via: http://bit.ly/1zv1Ywg Outro diferencial é que o próprio Professor Xavier não era o santo do pau oco de antigamente; o personagem alterava a mente dos seus alunos quando bem entendia, além de seus parentes e até de altos membros do governo e imprensa. Wolverine era o membro mais velho do time e só entrou nele porque na verdade estava a mando de Magneto para matar o Professor X. O primeiro arco foi um blockbuster digno de Michael Bay, com Manhattan sendo atacada por Sentinelas, Ciclope debandando para a Irmandade de Mutantes, o presidente americano nu à mercê de Magneto e com Xavier “matando” seu antigo aliado para salvar a pátria. A revista também tinha pesada influência do filme dos X-Men que Bryan Singer havia lançado no ano anterior. Assim como Ultimate Spider-Man, Ultimate X-Men também era um sucesso comercial, sendo a segunda revista mais vendida da linha X (perdendo apenas para New X-Men de Grant Morrison). Ainda no ano de 2001 a Marvel lançou mais um título: Marvel Team-Up com Bendis nos roteiros e uma série de desenhistas convidados. O Universo Ultimate não tinha nem dois anos direito e aqui já começaram a aparecer alguns problemas cronológicos que viriam a perseguir o selo. Ultimates Vol 1 Em 2002 veio a revista que serviria para consolidar o selo de vez: The Ultimates com roteiros de Millar e arte de Bryan Hitch. Aqui o roteirista colocou em prática todos os ensinamentos que aprendeu em Authority: realismo levado ao extremo, cenas de ação absurdas e ritmo cinematográfico. Hitch(,) que também veio do título da Wildstorm(,) demorava meses para desenhar cada edição, tamanho perfeccionismo na arte. Ultimates reimaginou os Vingadores como um grupo sob as ordens de Nick Fury (agora negro) e que constava na folha de pagamento do governo americano. Os Supremos (nome na versão brasileira) eram basicamente soldados, o apogeu da corrida genética que acontecia entre governos do mundo. Os personagens do grupo também sofreram algumas mudanças: Thor era um hippie maluco que muitos duvidavam que era um deus, Banner trabalhava para a SHIELD tentando recriar o soro do Capitão América, mas acabou criando o soro que deu origem ao Hulk, Gavião Arqueiro era um ex-atleta olímpico, dentre entre outras mudanças. O grupo tem preocupações do tipo quem vai interpretá-los em uma possível adaptação cinematográfica; o governo gasta milhões em relações públicas para manter o grupo na mídia, algo como se Cacau Oliver fosse o RP do time, e no final de contas os Supremos não tem quem enfrentar. Para isso uma solução é criada: Bruce Banner injeta o seu soro do supersoldado em si e acaba dando origem ao Hulk (tudo isso após descobrir que sua mulher estava jantando com Freddie Prize Jr.). A cidade de Manhattan é quase inteiramente destruída mas pelo menos o grupo agora faz sentido em existir e ganham o público. Um conceito brilhante que Millar faz disso da relação com o público e os “heróis” é quando há o funeral de quem morreu no ataque e Nick Fury escala o Capitão América para rezar pelos mortos em público, em uma clara jogada de marketing. Ultimates elevou o nível na indústria das HQs, sendo possivelmente a revista mais influente desde Watchmen (antes que alguém reclame, estou falando de influência, e não de qualidade) e também serviu como pontapé inicial para o amadurecimento da Marvel nos cinemas. Seu estilo cinematográfico com personagens reais e bem construídos fez com que a própria Marvel amadurecesse o universo 616, ao promover uma reformulação colocando Brian Bendis nos Vingadores, Warren Ellis no Homem de Ferro e Ed Brubaker no Capitão América, visando a aumentar sua verossimilhança. Enquanto o selo esteve concentrado nas mãos de Mark Millar e Brian Bendis tudo fluía de maneira boa, o problema foi quando ele começou a se expandir. Trabalhos fracos como Ultimate Adventures (procure por U-Decide no Google para entender a lambança), Ultimate Daredevil & Elektra e Ultimate Elektra pipocaram, além dos constantes atrasos de The Ultimates graças a Bryan Hitch. Ultimate Fantastic Four Vol 1 Em 2004 a Marvel resolveu lançar Ultimate Fantastic Four com roteiros de Brian Bendis e Mark Millar e Adam Kubert na arte. O grupo agora é extremamente jovem e surgiu graças a um projeto do governo americano (um tema recorrente no Universo Ultimate é a influência do governo, além da corrida genética) e seus membros, embora fossem os mesmos do 616, tem características diferentes: Sue é tão inteligente quanto Reed, o Coisa conhece Reed desde os tempos de colégio e o próprio Reed não é o líder do grupo, papel esse da Sue. A dupla de roteiristas ficou apenas no primeiro arco, posteriormente dando espaço para que Warren Ellis assumisse a bagaça. Ellis inseriu mais ciência e ficção científica no título até a volta de Mark Millar, agora solo. No ano seguinte Millar lançou The Ultimates 2, outro sucesso estrondoso. Meses antes, Warren Ellis escreveu Ultimate Galactus Trilogy para suprir um pouco a falta dos Supremos no mercado. O Universo Ultimate começou a decair quando Mark Millar saiu para concentrar seus esforços no universo Marvel tradicional. Mike Carey entrou em Ultimate Fantastic Four e embora tenha feito um trabalho competente o título virou apenas mais um no mercado. Bendis assumiu Ultimate X-Men, mas seu run não teve o mesmo brilho da fase do escocês. A revista ainda deu uma subida quando Brian K.Vaughan assumiu os roteiros, mas aí em seguida veio Robert Kirkman. (Na verdade vale ressaltar aqui um curioso capítulo que prejudicou Ultimate X-Men: a espera por Bryan Singer. Na época o diretor tinha acordado com a Marvel que iria fazer um arco para a revista após a era-Bendis. Porém ele enrolou a editora e com isso BKV foi ficando no título dando uma enrolada básica, mas aí quando Singer assumiu a direção de Superman Returns, restou a Marvel efetivar Vaughan como titular e mandá-lo amarrar todas as suas histórias em um plot único. Contudo, o dano já havia sido feito, pois este lado do Ultiverso rodou em falso durante quase dois anos, sem nenhum planejamento maior, apenas esperando pela vinda de Singer.) Kirkman que é um roteirista bem capacitado (Walking Dead e Invencível são a prova viva disso), mas sua passagem nos mutantes foi fraca. O roteirista optou primariamente por adaptar grandes sagas dos X-Men pro Ultiverso e o resultado foi bem abaixo da média. Mesmo também copiando alguns eventos e momentos em Ultimate Fantastic Four, Carey fugia um pouco disso. Ultimate Wolverine vs. Hulk Vol 1 #4 Os problemas cronológicos começaram a surgir, como a minissérie de origem do Homem de Ferro escrita por Orson Scott Card, contradizendo acontecimentos de The Ultimates. Ultimate Wolverine vs Hulk do escritor Damon Lindelof (Lost) foi lançada em 2006 e só concluída em 2009. A coisa degringolou de vez quando publicaram Ultimate Power iniciando a mistura de universos. Nessa mini em 9 partes escrita por Brian Bendis, J.Michael Straczynski e Jeph Loeb, os Supremos se encontram com o Esquadrão Supremo da fase Straczynski (da fase MAX) e fugiu da proposta básica do Ultiverso que era não complicar muito o que é simples. O ano de 2008 ficou marcado para muitos como o início do declínio da linha, pois foi nesse ano que Jeph Loeb, junto com Joe Madureira, lançou The Ultimates 3. A série que era conhecida pelo seu ultrarrealismo (até certo ponto, é claro) foi para uma vertente totalmente diferente, optando pelo tradicional super-herói old school. No mesmo ano, Brian Bendis ajudou a embolar ainda mais a cronologia lançando Ultimate Origins com certos fatos que não batiam com o que foi mostrado anteriormente. A série mostrou que os mutantes não eram uma obra divina e sim produtos de experimentos governamentais. Ultimatum Essa mini foi o prelúdio para Ultimatum, mini em 5 partes por Jeph Loeb e David Finch, apresentando as consequências de Ultimate Origins, quando Magneto descobre toda a verdade sobre os mutantes. O vilão enlouquece e inverte os polos magnéticos, causando muitas mortes ao redor do globo. Esse evento foi uma grande matança de diversos personagens do universo, principalmente os mutantes, olha a lista: Anjo, Fera, Blob, Vespa, Gigante, Demolidor, Ciclope, Wolverine, Magneto, Doutor Estranho, Forge, Cristal, Longshot, Fanático, Noturno, Professor Xavier, Mancha Solar, Polaris, Míssil, Cifra entre outros. A história é marcada pelo grande número de mortes e de momentos escatológicos, como no caso das mortes da Vespa, do Anjo e do Magneto. A mini foi massacrada pela crítica e pelos fãs também, mas serviu como um novo ponto de partida para simplificar a cronologia que começava a se complicar. Isso levou ao cancelamento de Ultimate Fantastic Four e Ultimate X-Men. Com isso a Marvel realizou o seu primeiro relaunch do selo, com Bendis permanecendo no Homem-Aranha, Jeph Loeb ficando com os New Ultimates e Mark Millar retornando com Ultimate Avengers (algo parecido com a divisão dos títulos New Avengers e Avengers no universo tradicional, com Bendis tocando ambos). Loeb também ficou responsável por Ultimate X, marcando o renascimento dos mutantes. A volta de Millar ao selo deu um gás e atraiu os fãs e a crítica novamente, mas foi muito pouco. Os gibis de Jeph Loeb atrasaram consideravelmente, tudo graças aos desenhistas envolvidos (New Ultimates tinha Frank Cho e Ultimate X contou com Arthur Adams. Ambos são conhecidos por suas artes detalhistas e seus costumeiros atrasos) e com isso o Ultiverso voltou a perder força. Bendis ainda tentou reverter o quadro lançando Ultimate Enemy, Mystery e Doom (mais uma trilogia) tornando Reed Richards um vilão, porém, não adiantou muito. Com isso a Marvel resolveu arriscar e publica Ultimate Avengers vs New Ultimates em um evento que culminou na morte do Homem-Aranha. A morte de Peter Parker ficou marcada como também a morte do Universo Ultimate tradicional e o fim de um ciclo que começou em 2000. Chegou a hora de mais um relançamento. Ultimate Comics Ultimates Vol 1 Em setembro de 2011, Ultimate virou Ultimate Comics e o selo voltou as suas raízes: Ultimate Comics Ultimates, Ultimate Comics X-Men e Ultimate Comics Spider-Man com um novo Aranha: Miles Morales (e ele é negro! – o que chamou a atenção de veículos jornalísticos fora do mundo das HQs, como o USA Today), escritos por Jonathan Hickman, Nick Spencer e Brian Bendis (sempre ele), respectivamente. O novo relançamento e o novo Homem-Aranha novamente atraíram a atenção do público, mas os problemas voltaram a aparecer: Hickman saiu fora para assumir os Vingadores e os Novos Vingadores na Marvel Now!, Spencer fez um trabalho fraquíssimo com uma trama confusa. Só Bendis conseguia fazer um trabalho digno de nota recriando o mito do Homem-Aranha com seu Miles Morales. Mas isso (teoricamente) tem uma explicação: na época a DC havia acabado de lançar o seu novo reboot. A Marvel começou a levar sistemáticas surras de vendas, fazendo com que a editora fizesse um movimento as pressas: o Marvel Now!. A editora retirou Hickman à força do selo Ultimate e colocou-o para revitalizar os Vingadores e sua linha. A própria Marvel achou que desperdiçar Hickman no Ultiverso seria desnecessário, assim como Spencer que também assumiu outro título da franquia dos Vingadores. Outro fator é que ambos os títulos vendiam menos de 10 mil unidades, número esse que é margem para cancelamento. Com a saída de Hickman, a Marvel colocou o novato Sam Humphries em seu lugar e o resultado foi um gibi morno e sem graça. Brian Wood assumiu os X-Men e fez lembrar os bons tempos do título, enquanto que Bendis permaneceu firme e forte no Aranha. Desesperada, a editora resolveu arriscar e fez algo que Joe Quesada jurou de pés juntos que jamais faria: promover o encontro entre os personagens do Ultiverso com o dos 616. O resultado disso foi Spider-Men, com Miles se encontrando com Peter Parker, roteiros de Brian Bendis e arte de Sara Pichelli. Embora a história seja muito boa, esse foi um sinal de que as ideias para o selo estavam indo para um caminho sem volta. Percebendo que as vendas estavam caindo de novo a Marvel resolveu chutar o pau da barraca. Colocou Joshua Hialkov para escrever Ultimate Comics Ultimates, preparando o terreno para Hunger, que lidava com as consequências do Galactus indo parar no Ultiverso (tudo isso graças ao final de Age of Ultron). Em novembro de 2013 foi lançada Cataclysm: The Ultimates Last Stand por Brian Bendis e Mark Bagley, marcando o confronto dos heróis contra Galactus, cujas principais consequências foram as mortes do Capitão América e do Thor. Ficando cada vez mais sem heróis e seus medalhões principais, a Marvel tacou mais um relançamento. Miles Morales: Ultimate Spider-Man Vol 1 #7 Em abril de 2014 foi a vez de All-New Ultimates, Ultimate FF e Miles Morales: The Ultimate Spider-Man chegarem ao mercado sob o selo Marvel Now! (mais uma jogada da Marvel para tentar vender mais, pois a Marvel Now! pertence aos gibis do universo tradicional). Michel Fiffe (do webcomic Copra), Joshua Fialkov e Brian Bendis (não largando o osso) ficaram responsáveis por tentar salvar a parada. Mas claro que deu merda! Ultimate FF foi cancelada na sexta edição, All-New Ultimates foi cancelada agora na edição 12 que saiu neste mês de janeiro, restando apenas Miles Morales: The Ultimate Spider-Man. A linha agora basicamente só tem um título, marcando um fim melancólico. O selo que influenciou os rumos da indústria dos quadrinhos e do cinema virou uma mera sombra do que já foi. Enquanto eu escrevia esse texto a Marvel soltou as solicitações de Abril e lá consta que a edição #12 de Miles Morales: The Ultimate Spider-Man será a ÚLTIMA do título. Além de praticamente confirmar que o Ultiverso vai pro saco graças aos eventos de Secret Wars. Alguns sinais foram dados, como o teaser com um singelo THE END, além da capa de Avengers #41 que é a MESMA de The Ultimates #1. Quem está acompanhando Avengers e New Avengers sabe que está rolando o mini evento Time Runs Out com diversas terras do universo Marvel sendo destruídas para tentar evitar a destruição da Terra 616. Uma dessas terras pode ser a do selo. Em outubro desse ano o Ultiverso irá completar 15 anos. Resta saber se conseguirá chegar até lá.