Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+ Compartilhar no Tumblr #Todo o Horror da Perfeição Assistir produções autorais como Whiplash é um imenso prazer, pois ver um instrumento musical como protagonista simbólico é algo sempre bem-vindo. A história nos apresenta a evolução de um baterista obstinado, que tenta transcender não só seu talento percussivo, mas também sua história, sua mortalidade. Esta ambição do personagem Andrew pelo sucesso é desmedida, algo que beira a loucura. Mas a intenção parece compreensível, afinal, ele possui a habilidade necessária para se consagrar um grande músico de jazz, e não importa o quão próximo do sol precise voar para conquistar isso. E no caminho do suposto gênio das baquetas existe um mestre a procura do pupilo perfeito. Na verdade, para ser mais exato, estamos falando de um carrasco, capaz de ofender Andrew de tantas formas diferentes que qualquer um ficaria surpreso. O maestro Fletcher vê no abuso verbal e na humilhação uma ferramenta de crescimento eficaz. Ele desmerece a família de Andrew de maneira vulgar, até atira cadeiras na cabeça do baterista, para que o mesmo nunca perca o – quase inalcançável – tempo rítmico perfeito (a complexa composição Whiplash, que leva o nome do filme, é um de seus maiores desafios). Você arrasta ou você acelera?!, vocifera o maestro em certo momento. Fletcher simboliza mais do que uma ideologia extremista de ensino, ele é basicamente uma sentença de morte. O filme foi dirigido e roteirizado por outro jovem genial. Damien Chazelle começou sua carreira quase agora, e promete um futuro instigante para este gênero em específico, de músicos perturbados e canções impossíveis. Seu texto investiga com realismo a sede insaciável de Andrew pela glória do reconhecimento, que torna o mundo ao seu redor pouco importante, e que corrompe, mas ao mesmo tempo edifica sua personalidade. As escolhas técnicas de Chazelle em Whiplash são de um senso avidamente apurado, uma cadência perfeita que equilibra a ótima interpretação dos atores com a exploração de ambientes internos sufocantes, onde acontecem performances musicais incríveis. A iluminação difusa é um dos pontos de maior destaque, e ajuda na construção de um clima de tensão quase claustrofóbico. Visivelmente inspirada pela história, a equipe de produção presta atenção total aos detalhes. O trabalho de fotografia é impecável, assim como o de cenografia e edição. O departamento de som lida com o peso de sua responsabilidade com extrema facilidade, e o exímio compositor Justin Hurwitz é o nome por trás da maioria das composições originais do filme. O ator do momento, Miles Teller, interpreta Andrew, e o experiente J.K. Simmons, Fletcher. Os personagens parecem opostos em quase todos os sentidos, menos em um: o desejo visceral de escrever o nome na história do jazz. O trabalho dos intérpretes é surpreendente. Teller pode ser considerado o menos expressivo dos dois, mas sua capacidade de fingir ser um baterista de jazz vai além da compreensão. Obviamente ele é muito versátil, encara dramas com responsabilidade e também possui um excelente timing para comédias, mas o fato é que neste filme ele simplesmente decolou na bateria. O cara nasceu para este papel. E pensar que Dane DeHaan era a primeira opção. No entanto, é inegável que o Fletcher de J.K. Simmons é seu momento Charlie Parker. Não é a brutalidade do maestro o que mais chama atenção – quem conhece o trabalho de Simmons, sabe que ele consegue interpretar cretinos arrogantes de maneira primorosa. O que mais chama atenção é a capacidade do ator de transformar o personagem em um ser humano normal, através de situações cotidianas. São os momentos em que ele não está ofendendo ninguém (rindo com crianças, bebendo com amigos no bar) que fazem de Fletcher um sucesso, porque sua normalidade o torna quase inconcebível, e ao mesmo tempo extremamente real. Simmons humaniza Fletcher, e demonstra que, por trás da raiva explosiva existe sim um ideal, não apenas motivado frustrações ou traumas passados. É algo maior. Essa profundidade faz dele um ser admirável, de maneira bem incomum. Em resumo, Whiplash é fúria e gratidão, baixo calão e poesia. O filme apresenta duas pessoas com um ideal em comum, colidindo violentamente, e mesmo não compreendendo elas se moldam, e no momento certo, com um olhar apenas, se completam. Filme Obrigatório. [quote_box_center]Curiosidade: Quando era mais novo, Miles Teller sobreviveu a um violento acidente de carro, no qual foi arremessado pela janela em uma das muitas capotagens do veículo, o que lhe deixou com diversas cicatrizes no rosto, e lhe rendeu seu primeiro trabalho como ator no filme Reencontrando a Felicidade, que precisava exatamente de um jovem com cicatrizes no rosto.[/quote_box_center] Whiplash: Em Busca da Perfeição (EUA / 2014 / 107 min ) 2626Direção: Damien Chazelle / Elenco: Miles Teller, J.K. Simmons, Paul Reiser, Melissa Benoist