Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+ Compartilhar no Tumblr Quando a Dolphin sugeriu uma pauta de postagem sobre a Deep Web na MOB, fiquei curioso com que porra era esse troço. Como não fazia idéia do que se tratava, fui ao mefistofélico mestre Google obter algumas respostas. Lendo uma das primeiras páginas linkadas (um Fórum Anti-Nova Ordem Mundial *vômito*), fiquei surpreso: Entre alguns comentários sobre quem navegou na DW e não achou nada demais, se seguiam algumas descrições apocalípticas (afinal, é um fórum de esquizofrênicos anti-NOM) sobre a nocividade deste ambiente “satânico, criminoso e cheio de vírus”. O que teria a Deep Web de tão aterradora para um ADM anti-NOM (acostumado com conspirações diárias) fazer o comentário da imagem acima? É claro que essa atmosfera criminal só me deixou mais doido ainda pra entrar na DW! Eu queria experimentar um pouco da sensação de andar por um ambiente obscuro da internet. Navegar nas águas além dos conhecidos “seven proxyseas*”, o que significa também estar longe dos tentáculos do Google e outros buscadores. Uma Zion* da web? Bom, eu queria ver esse bagulho, então antes de ir pro lado de lá da internet comecei a ler sobre o conceito de Deep Web (ou Dark Web para os messias do fim dos tempos). Pra minha surpresa, primordialmente o que se chama de DW não passa de todos os sites que não são indexados pelos buscadores. “Quem não deve não teme, por que ocultar um site?”, pode dizer um babaca qualquer. Ouras, as pessoas simplesmente podem não querer que o conteúdo de seus fóruns seja listado em buscas no Google, é uma opção pessoal que não necessariamente tem a ver com mau-caratismo e sim com limitar o alcance das informações particulares. Um grupo religioso específico, por exemplo, uma seita, tem o direito de se manter sob sigilo. Você já pensou que o acesso à internet em grande parte é controlado pelo Google? Afinal, quando você quer buscar um assunto, você vai lá pesquisar no Google (como eu fiz com “Deep Web”), e isso dá a essa empresa um poder imenso de manipulação, pois ele tem seu próprio método sigiloso de listagem. De certa maneira, hoje não sabemos encontrar sites senão pelo Google. Antigamente, antes da popularização dos buscadores, os sites eram divulgados assim como os números dos telefones, de boca-em-boca, pessoa-a-pessoa, em fóruns, nas ruas e assim por diante. Os sites que se mantém fora desse sistema de ranking dos buscadores até hoje é um dos tipos que chamamos de Deep Web, sites fora do radar. Porém, há outro tipo de Deep Web bem mais interessante e libertária do que apenas estar fora dos sistemas de indexagem dos buscadores. Também chamados de darknets, existem sistemas como o Freenet, uma rede P2P de compartilhamento de informação totalmente descentralizado (ouras, é p2p) ! Como surgiu o Freenet? O criador Ian Clarke responde: “Surgiu da vontade de construir um sistema completamente descentralizado que funcionasse. Nós humanos insistimos em construir sistemas centralizados – se uma das peças é retirada, ele simplesmente para de funcionar. Na freenet não adianta tirar os nós da rede: ela se reconectará automaticamente. A natureza vem fazendo isso há milhões de anos, com sucesso. A internet original era algo parecido, mas a freenet leva isso adiante – é mais interessante e funciona melhor. A segunda motivação é mais filosófica. Estamos vivendo uma época complicada em questões de censura, como nos exemplos do Carnivore [programa do FBI para monitorar e-mails] e assemelhados. É importante criar a ferramenta para publicar e distribuir informação, com anonimato e segurança.” [1] Com o Freenet, cada computador se torna um servidor e um cliente, sendo possível tanto acessar quanto compartilhar dados. Não há como se ter domínio sobre algum dado nesse sistema, se alguém pode acessar, poderá também copiar e compartilhar com os outros, e tudo isto de maneira anônima. E não há como desligar o sistema, a não ser que todas as máquinas que estão compartilhando (todos os usuários) sejam desconectados. Provavelmente os governos têm suas próprias redes de compartilhamento de informação num sistema F2F (Friend-to-Friend, que diferencia do P2P apenas por ter um controle de IPs e por isso protocolos). O que acaba por tornar essas redes governamentais parte da “Deep Web”. Basicamente temos então três tipos de Deep Web: a primeira composta de sites não são indexados por buscadores; a segunda de sites compartilhados em sistemas P2P; e a terceira de redes privadas F2F. O navegador-servidor do Projeto TOR é uma mistura de P2P com F2F, ele acessa endereços específicos do pseudo-domínio .onion, os mais comuns da DW, através de requerimentos específicos do proxy já reconfigurado do navegador, no entanto isso acontece de maneira relativamente anônima, dando liberdade ao usuário. Entendido mais ou menos o que é Deep Web, com o TOR já instalado, chegou finalmente o momento de navegar nesse espaço amaldiçoado por tantos como “covil da pornografia infantil e da degeneração humana”. Nos fóruns e em vários blogs as pessoas indicam a não usarmos o computador diário para entrar na DW, alguns sugerem até mesmo que se instale algum LINUX em outro computador por segurança. Bem, a verdade é que três horas após começar a ler sobre DW eu já não me aguentava mais de vontade de entrar por lá. Quando tomei a decisão de entrar com o meu RWINDOWS do jeito que tava deu um frio na espinha, a sensação de adentrar um cyber-espaço mítico que já rendeu tanta discussão era um tanto quanto desconfortável, mas simplesmente abri o TOR e………. adivinhem? Meu computador não explodiu, não peguei nenhum vírus e não recebi nenhum aviso da Samara que vou morrer dentro de 7 dias! E olha que já fucei no diabo a 4 na DW e até agora não sofri nenhum dano. Mas depois de adentrar, o que fazer? Só tinha a porra dum navegador aberto (o Firefox configurado pelo TOR) como qualquer outro. Pra onde ir agora? Quando se navega para além dos oceanos conhecidos você tem que começar a tatear por aí. Fui então na Hidden Wiki, a pedra angular de todo iniciado na DW. Só que lhes digo logo: a Hidden Wiki é basicamente sensacionalismo. Lá você vai encontrar exatamente aquilo que a mítica da DW diz: um monte de snuffs, pornografia infantil, mercenários contratáveis e coisas do gênero. Muitas das pessoas que vão por curiosidade pra DW param suas investigações por aí, por que encontram exatamente a confirmação daquilo que as pessoas na Surface Web diziam. Talvez esta seja a função da Hidden Wiki, afastar os levemente curiosos do conteúdo mais interessante, ou no mínimo desincentivar a busca por outras coisas. Por isso não fiquei satisfeito com a Hidden Wiki e através dos links dela fui procurar mais coisas. Pra começar fui ver o preço do LSD no mercado negro, já que anda tão difícil encontrar aqui no Brasil (e impossível ultimamente aqui no meu Piauí): Depois resolvi dar uma olhada em alguma coisa mais pesada, então encontrei o paraZite, um site que existe de forma relativamente leve na Surface Web, mas que na Dark Web tem muito mais conteúdo ilícito. As temáticas vão de informações aleatórias e tutoriais de hacking, crime, privacidade, criptografia e drogas, até blasfêmia, atividades sexuais não populares, violência social, nazismo, racismo, revisionismo e terrorismo. Como uma rede de compartilhamento de informação radicalmente anti-autoritário, o paraZite não tem receio de expor manuais de tortura, estupro, produção de bombas, drogas, etc. Tem de tudo lá, até vídeos, documentos e imagens dos ataques terroristas da Al-Qaeda, por exemplo. Os caras são muito doido e ainda tem senso de humor: Acompanhei por um tempo um fórum de ~raquis~ na Deep Web, o Caravana Brasil. Saca só como o garotinho ADM do fórum é irritadinho e cheio dos motivos pra fazer ataque DDoS: Noffa, ele e seus amigos também derrubaram um site evangélico, e a GameVício: Pra entenderem o motivo pelo qual o cara tem tanto odiozinho no coração contra a GameVício : Só com esses exemplos já podemos observar o tanto de funcionalidade auto-organizativa libertária que pode ter a Deep Web (e também como um bando de moleques pode fazer estragos por se sentir totalmente livre lá). Alguns exemplos: O Wikileaks primeiro se estruturou lá antes de ir pra Surface Web; grande parte do Anonymous funciona lá, já que é um ambiente que dificulta em muito o rastreamento de IP; grupos anarquistas (encontrei um site Grego bem interessante) mantêm troca de informações por lá… há incontáveis usos positivos na DW, inclusive a possibilidade de hospedar torrents, fugindo do controle dos domínios comerciais, caso em breve a coisa fique preta de vez; tem muito download de livros que só se encontra em sites não catalogados, as vezes até bibliotecas digitais inteiras de universidades com fácil acesso! Em dias obscuros de ACTA/SOPA como os de hoje, a Deep Web pode ter um papel de fundamental importância em pouco tempo. Seja através da descentralização total com plataformas como o Freenet, ou da descentralização parcial como através dos Proxys do Projeto TOR (que mantém o pseudo-domínio .onion funcionando em seus servidores). Pra ser sincero, considero uma questão de tempo habitarmos a DW e a transformarmos em um entreposto de troca de informações, sem todas as bobagens que se diz dela na superfície, por isso luto sim pela popularização do lado de lá da webz. “Ah, mas com todo mundo navegando anonimamente e podendo fazer o que quiser, a pornografia infantil e as coisas ruins vão se espalhar muito. Qualquer um poderá ter acesso a informações perigosas!”, alguns podem argumentar, mas respondo da mesma forma que Ian Clarke (o criador do Freenet, pra quem esqueceu) respondeu a esta questão: “Uma internet totalmente livre terá em seu conteúdo apenas o reflexo da humanidade. Se tivermos a produção em massa desse tipo de lixo, o problema é profundo demais para ser resolvido com uma burra censura universal do meio.” É, talvez haja uma Zion a se construir na Deep Web. Vamos todos dar uma voltinha por lá? Notas: [1] Trecho do texto retirado daqui. Seven Proxyseas: http://choc.la/i9w Zion: É a principal cidade de toda a série The Matrix. Créditos da imagem: Brandpowder