Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+ Compartilhar no Tumblr Leia também: Parte 1 | Parte 2 | Parte 3 | Parte 4 | Parte 5| Parte 6 | Parte 7 | Parte 8 | Parte 9 | Parte 10 | Parte 11 Por uma série de motivos que nem eu consigo explicar direito, essa série teve uma pausa de mais de sete meses. O motivo principal é, naturalmente, a morte semi-prematura do meu notebook. É um Dell Inspiron 14 com três anos de uso e do nada não ligou mais. Consegui retirar o HD e pegar os arquivos que queria, e simplesmente relaxei dessa história de escrever toda a semana. No início fiquei desesperado, depois fiquei tranquilo. Foi quase uma experiência nova, que não me trouxe problemas, já que o notebook morreu depois da minha Monografia já estar completona e revisada. De lá pra cá li bastante, inclusive um monte de livros que estavam acumulados, e mudei bem minha rotina. Posso dizer que pra melhor. Tirei Tarot para saber os motivos disso e “uma forte sobrecarga” apareceu. Não me sentia deveras sobrecarregado, mas provavelmente estava rumando pra isso. Agora retorno para a reta “final” dessa série – pretendo seguir com partes regulares até o 10 – e depois com partes “addendum”, com assuntos mais aleatórios. Nesse período escrevi sobre magia pra VICE, fazendo a cobertura do III Simpósio de Hermetismo e Ciências Ocultas – e arrumando alguns problemas no processo (falo sobre isso futuramente). Estou com várias entrevistas ainda não-editadas do evento e publico aqui em breve também. Geralmente também respondo as perguntas feitas nos comentários e as enviadas por email, então fiquem atentos a seção de comentários dos artigos da seção – e para maiores dúvidas, mandem um email. Mas, chega de papo! Volto com a coluna com uma contradição, estampada no título – e com o post mais etéreo e teórico da série. Na parte 6 disse que não reservaria um texto sobre Iniciação, e aqui está ele. Magia e vivência é isso: dizer algo e tempos depois mudar de ideia elegantemente, apresentando os devidos argumentos que o motivaram. Todas as nossas verdades devem ser provisórias e nós devemos ser conscientes dos motivos pelas quais as adotamos. Quando escrevi a parte 6 parecia razoável eliminar a Iniciação do processo – agora não me parece mais. Boa parte da culpa é de um filme bizarro e único, chamado A Montanha Sagrada, escrito e dirigido pelo igualmente singular Alejandre Jodorowsky. Assisti ao filme em meio a um tratamento contra pneumonia, após guarda-lo no HD do meu computador por um longo período – e depois transferi-lo para o notebook do meu serviço. Difícil assisti-lo em um momento mais propício, logo depois de A Estrada Perdida, de David Lynch, outra exemplar de qualidade do cinema insano. O filme é um festival bem dirigido e aparentemente sem rumo que envolve metalinguagem profunda, misticismo pop de primeira e uma série de insights bizarros misturados com crítica social da pesada. É o tipo de filme experimental que vai ao limite do limite, só possível quando criado à margem de esquemas comuns de filmagem. Difícil esperar algo diferente de Alejandro Jodorowsky, um cara que se tornou conhecido graças às referências ao Ocultismo em suas obras e suas teorias meio diferentonas do Tarot – mais ou menos como Alan Moore fez em Promethea. A obra mais conhecida dele é Incal, que pode ser encarada como uma interpretação da jornada do Louco no Tarot – o personagem principal se chamar Difool (The Fool, o Louco, o Arcano zero do Tarot) não é à toa. A Montanha Sagrada é um Incal menos pop com (mais) LSD e soa como um manual para a iluminação criado sob medida por Jodorowsky, que no filme assume o papel de Guru Sabe-Tudo. A sinopse de A Montanha Sagrada fala mais ou menos o seguinte: “nove dos mais poderosos industriais e políticos dos planetas desejam obter a imortalidade. Um Alquimista (Jodorowsky) lhes fala da Montanha Sagrada da Ilha de Lótus, onde moram nove imortais, que agora têm mais de 30.000 anos. ‘Alguns homens juntam forças para assaltar bancos e roubar dinheiro’, o Alquimista conta. Mas os poderosos devem unir forças para assaltar a Montanha Sagrada e roubar desses homens sábios o segredo da imortalidade. Mas para conquistar o segredo dos imortais, nós também devemos nos tornar homens sábios”. Parece familiar? Sim, pois isso é um resumo de qualquer jornada iniciática. Como vocês já devem ter adivinhado, a própria jornada é a iluminação/iniciação, e não o assalto aos Nove Imortais da Montanha Sagrada. O segredo final revelado pelo Alquimista, é uma metralhadora metalinguística para dar uma sacudida mental em qualquer um. Mas até chegar a esse desfecho simples e ao mesmo tempo apoteótico, Jodorowsky nos brinda com sua própria interpretação das engrenagens que movem o mundo e o que é preciso fazer para se livrar delas. O filme começa com um típico Cristo, um vagabundo chamado de Ladrão que representa os heróis populares saídos das massas, com ascendências nobres. Mais ou menos como Hércules, também um mortal que alcança a imortalidade pelo auto-sacrifício. Ladrão só consegue a amizade de um anão sem braços e pernas, para logo depois ser crucificado e apedrejado por um grupo de crianças mal intencionadas. Saindo dessa pequena vila, Ladrão conhece a Cidade, recheada de prazeres baratos e violência psicológica. É lá que presenciamos cenas de crítica social grotesca, como um desfile de soldados com carcaças de bezerros e uma encenação da conquista do México por Hernán Cortés… interpretada por sapos, que no final explodem (a cena é foda, por sinal). Ladrão conhece então a vida dura de um proto-Messias: um grupo de religiosos o sequestra e faz cópias dele de gesso enquanto ele dorme, e um bando de prostitutas de quinta classe o segue com o tipo de fé cega que costumamos ver nos religiosos mais ferrenhos (fiéis-prostitutas, outra metáfora). Esse momento do filme é uma experiência puramente sensorial, praticamente sem diálogos, como uma espécie de introdução mundo-cão para chocar os mais fracos, além de mostrar o momento em que Ladrão sai do mundo terreno – Malkuth, para os Cabalistas – e inicia sua própria jornada em busca da libertação. É uma demonstração do quão doente é o mundo que vivemos, além de dar umas alfinetadas no modus operandi de governos planeta afora. É uma porrada mental, mas não passa de mera preparação para o que o filme reserva em seus próximos momentos. Ladrão encontra uma torre e uma forma de subir nela, e é lá que está o Alquimista, nossa porção psicológica mais iluminada, por assim dizer. Ladrão é então iniciado, em uma cerimônia que mistura Yoga, Tarot, espelhos (uma forma de auto-análise, assim como as outras duas técnicas) e sabedoria saída das próprias fezes (!). Depois das devidas mudanças físicas, Alquimista apresenta a Ladrão “os seres mais poderosos do mundo”, representados por oito planetas mitológicos, que nada mais são que Arquétipos do Inconsciente Coletivo propostos pela Psicologia Jungiana. “São ladrões como você, mas em outro nível”, afirma ele. Ladrão é uma representação do Ego, enquanto os Planetas são formas-pensamento universais que percorrem a história humana. As duas estruturas estão ligadas, mas de forma separada. Os planetas são heróis mitológicos, que naturalmente representam “nossos Eus” de forma bem detalhada. Alquimista descreve um a um, profundamente e com interpretações modernas geniais do papel sociológico de cada um desses Deus-Planetas. Vênus como um dono de indústrias têxteis e de moda vivendo em uma corte estilão Marquês de Sade, ou Marte como uma mulher que fabrica o ódio e armas especiais pra matar judeus (em forma de Menorá), cristãos (em forma de crucifixo) e encomendando guerras em programas de TVs é atual até hoje, e deveria ser analisado em cursos de Comunicação. Entre outros – veja por você e depois dê uma estudada no papel de cada planeta que vale a pena o esforço. Depois dos Oito se juntar a Ladrão e Alquimista é hora de se livrar dos entraves materiais – dinheiro, o Ego (aqui chamada de Auto-Imagem, e representada por manequins anteriormente presos numa das paredes do templo iniciátivo) – e logo depois abraçar a Loucura e a Morte. Só assim, abdicando de tudo que os torna humanos, alguém pode ser Imortal, próximo dos Deuses, um Mago. Na Magia do Caos isso ocorre em todos os Rituais, Sigilos e criação de Servidores. Essa é a grande lição: não é necessário a separação do mundo, viver no mato ou chamar a humanidade de “gado”, mas sim treinar a mente para separar-se de tudo que o liga a ele quando necessário. Essa habilidade é a chave da Magia e o objetivo da Iniciação / Iluminação. Por isso a Iniciação é tão importante: ela é como tomar um choque e entender a natureza da Magia, é como acessar um lado escondido da própria Psique. Em um minuto você está se iniciando em uma egrégora lendo esse texto, e no outro cai em si que era apenas um texto qualquer em um blog qualquer, e depois ri do fato de dar alguma importância a um monte de pixels em um monitor. Hoje você se inicia numa Ordem Rosacruz (ou outra qualquer, isso é um mero exemplo), e amanhã conclui que são apenas caras querendo dinheiro (situação hipótetica, antes que mandem pedras). Naquele momento você se iniciou, e aquela iniciação foi importante, mas amanhã ela pode deixar de ser primordial e você parte pra outra. É tudo parte de um processo continuamente evolutivo, se você não muda de ideia, ri do próprio passado, questiona o grão-mestre da sua Ordem, pensa se a todo momento está no caminho certo, é bastante provável que esteja errado, parado, morto. Se você não está em conflito intelectual com nenhuma ideia, com alguma pessoa, amigo, inimigo, livro ou site, isso significa que você optou por boiar em águas calmas e que sua evolução está em processo letárgico. Robert Anton Wilson dizia que nossa experiência deveria ser contada pelo número de vezes que mudamos de ideia, e não pela idade. A capacidade de mudar de ideia quando necessário é de suma importância para o praticante de Magia, a flexibilidade intelectual é a chave do aprendizado. Rejeite dogmas, rejeite autoridade, identifique as cordinhas que mantém todos de pé! Amanhã essas habilidades serão necessárias. Quando for capaz de fazer isso, considere-se iniciado ao menos uma vez. A Montanha Sagrada é um conjunto de técnicas – não apenas visuais e sonoras, mas simbólicas – para colocar a Iniciação ao alcance de todos, de forma quase Universal. Apesar do meu foco aqui ser bem prático, não serei dessa vez, pois como disse anteriormente, Iniciação é um assunto que varia enormemente. Até a próxima! Leia também: Parte 1 | Parte 2 | Parte 3 | Parte 4 | Parte 5| Parte 6 | Parte 7 | Parte 8 | Parte 9 | Parte 10 | Parte 11