Amigos, Amigos, Negócios à Parte

Como o próprio título explica, 1981 foi um dos anos mais violentos da cidade de Nova Iorque. Manter um negócio de forma honesta era uma missão praticamente impossível, o clima era de ladrão rouba ladrão e quem bate mais forte manda. Mas aqui estamos falando de negócios “legítimos”, como uma companhia de óleo por exemplo, que rouba o caminhão da concorrência sem suar uma gota de remorso. Não fazer parte do acordo, não aceitar facilitações, ou mesmo não permitir funcionários armados, são fraquezas fatalmente exploradas pelos adversários. Escolher trilhar um caminho honesto faz de você um alvo aparentemente fácil.

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No entanto, neste novo filme do diretor e roteirista J.C. Chandor, a persistência é o grande diferencial da história. O protagonista Abel Morales, imigrante latino que prosperou nos Estados Unidos com sua empresa Standard Oil, definitivamente não é um alvo fácil. Na verdade, ele parece um símbolo americano ambulante, daqueles que provam que o sucesso vem para quem se esforça. O cara é um diplomata natural, que sabe como se expressar, como liderar e inspirar seus funcionários, que pensa meticulosamente antes de lidar com as mais extenuantes situações em que se vê envolvido. Obviamente ele também falha, e pode até ser considerado suspeito por muitos – tudo é meio nebuloso inicialmente, pois o hipnotizante roteiro de Chandor faz questão de não estabelecer nenhum tipo de background explícito para trama e seus personagens, tudo começa abruptamente e vai se amarrando gradativamente.

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E diante desse mote, percebemos a quebra de certos padrões criativos, principalmente para o gênero mafioso. A obra de Chandor consegue se comunicar de maneira extraordinária, pelo simples fato de optar por um ideal que hoje parece perdido, a busca pela honestidade. O filme exemplifica todas as dificuldades diretamente ligadas a esta escolha, e demonstra a seriedade e principalmente a frieza necessária para se manter persistente. O texto faz isso sem glorificar as atitudes do personagem, pois deixa claro que a diferença entre o bem e o mal é tênue. A consolidação digna do nome Standard Oil se tornou o único objetivo de Morales, ainda mais quando forças externas demonstram sem medo sua gana de corromper. As filhas e a esposa Anna, são a motivação que mantém o empresário focado, tanto moralmente como financeiramente. Mas ser lembrado como exemplo de sucesso diante das adversidades, isso de fato é uma recompensa tentadora. No final, tudo é uma questão de ego, ironicamente.

J.C. Chandor já falou de persistência em seus trabalhos anteriores. Em 2013, ele surpreendeu com o filme Até o Fim, drama de um homem só em que Robert Redford tenta desesperadamente se manter fora d’água, após seu barco colidir com um contêiner perdido no oceano. Com O Ano Mais Violento, a narrativa consegue ser ainda mais envolvente. Sua abordagem valoriza principalmente o desenvolvimento dos diálogos, o andamento das cenas e as interpretações do elenco, o que consequentemente enfatiza a incrível história que está sendo contada. Visualmente, ele opta por tomadas contemplativas belíssimas, e perseguições angustiantes, como a fuga pela ponte 59th Street Brigde, perfeitamente orquestrada. Mas qualquer que seja o ângulo, a cidade de Nova Iorque sempre chama atenção como o pano de fundo perfeito, hora ensolarada, hora coberta por uma espessa camada de neve, mas sempre imponente.
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Uma história como essa só poderia ser contada por intérpretes de honra. O protagonista Abel Morales inicialmente seria interpretado por Javier Bardem, o que não aconteceu. Oscar Isaac foi chamado para preencher a vaga, e sinceramente, fica difícil imaginar outra pessoa para o papel, a não ser um Al Pacino de 30 anos atrás. Interpretando a esposa Anna temos Jessica Chastain, talvez uma das mais belas e talentosas atrizes da última década. Mesmo não conhecendo por completo o passado da personagem, percebemos todas suas diferentes camadas vividamente. Uma construção exemplar de Chandor, um trabalho impecável de Chastain. No elenco estão também Albert BrooksDavid Oyelowo, Elyes Gabel e Alessandro Nivola.

Por fim, O Ano Mais Violento é um clássico do cinema. É um sucesso técnico e autoral, que analisa as raízes do crime organizado disfarçado de American Dream, e faz isso de maneira realista, racional, e ao mesmo tempo poética. Durante todo o ano de 1981, Morales persistentemente tenta ser justo, só que mesmo o mais íntegro dos negócios acaba batizado com o sangue de inocentes. Recomendado.

[quote_box_center]O Ano Mais Violento/ A Most Violent Year: (EUA, Emirados Árabes Unidos/ 2014)

Duração: 125 min

Direção: J.C. Chandor

Elenco: Oscar Issac, Jessica Chastain, David Oyelowo, Alessandro Nivola, Albert Brooks, Elyes Gabel, Catalina Sandino Moreno[/quote_box_center]

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