Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Google+ Compartilhar no Tumblr Quando as luzes se acenderam após Eu terminar de ver O Cavaleiro das Trevas, um espetáculo visual que definitivamente levou os filmes de heróis para um nível muitíssimo mais elevado, a natural pergunta surgiu na mente: Puta que pariu, Christopher Nolan, o que você tem em mente para ultrapassar esse nível de qualidade? A pergunta é mais que natural. Encerramentos de trilogias são um negócio complicado. Matrix Revolutions foi uma grande porcaria, após um segundo capítulo que entrou para o rol de filmes de ação memoráveis. O Poderoso Chefão III não é de todo ruim, mas ficou muito aquém dos outros dois capítulos da segunda melhor trilogia já feita. O Retorno de Jedi também não é um filme ruim, mas é completamente eclipsado por O Império Contra-Ataca. Só O Retorno do Rei é que conseguiu fechar com todas as pompas a grandiosidade que foi O Senhor dos Anéis, sem sombra de dúvida a melhor trilogia da história do cinema. Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge tinha missão similar. Quando Nolan foi chamado para assumir a frente de uma recriação completa do Homem-Morcego no cinema – uma resposta ao sucesso estrondoso dos filmes da Marvel, principalmente os corretos X-Men e Homem-Aranha, trilogias que também entregaram terceiros capítulos completamente esquecíveis – ele encontrou um personagem absolutamente destroçado. A imagem do Morcego cravada na mente de pelo menos duas gerações que somente o acompanhavam no cinema foi de um herói patético, com vilões palhaços e possuidor de uma absoluta falta de qualquer história. O próprio Batman era completamente raso, seus quatro filmes de Batman (1989) a Batman & Robin (1997) criaram somente o background de que o herói teve seus pais mortos – pelo Coringa, para economizar espaço em tela. Batman não tinha motivação, habitava uma cidade bizarra, uma mistura de arquitetura gótica de mal gosto com capangas assassinos que não viam problemas em ser dançar pelo meio da rua. Nolan varreu isso tudo para um passado distante quando apresentou sua visão ultra-realista, moderna e urbana do herói em Batman Begins. E O Cavaleiro das Trevas Ressurge é essa visão única e inimitável levada às últimas consequências, uma mostra sombria de como Batman pode existir em nosso mundo “real”, sem precisar de uma ambientação grotesca e fantasiosa. A Trilogia do Batman não é exatamente uma adaptação quadrinhos-cinema, mas uma versão do diretor de um personagem lendário. Não por acaso, Nolan escolheu a melhor faceta do herói – a de justiceiro obcecado – e a misturou com a versão playboy do herói. Mas, em diversos momentos do filme não é difícil concluir que Bruce Wayne serve unicamente para dar um outro lado ao Batman, que é a verdadeira identidade dele, algo profundamente questionado em obras como Watchmen. Em O Cavaleiro das Trevas Ressurge damos um salto de oito anos após o fim do capítulo anterior, rumo a uma Gotham City pacificada. A imagem poderosa do herói Harvey Dent gerou a Lei Dent, que endureceu o Estado o suficiente para limar o crime organizado da cidade. Blackgate, a principal penitenciária da cidade, está cheia de prisioneiros – nenhum deles com direito a habeas corpus ou outros direitos garantidos por lei. É a velha história de que para combater o mal é preciso criar um mal ainda maior. O plano de Batman e do Comissário Gordon dá certo, e da falsificação da imagem de Dent a cidade vence a criminalidade. Wayne vive recluso em um pedaço de sua mansão, com propensões a mesma esquizofrenia que atacou Howard Hughes durante seus momentos em Las Vegas. É o veterano de guerra em seus piores dias, à espera de problemas para mostrar sua verdadeira face. Mas é uma paz frágil, pronta para ser destroçada ante a primeira instabilidade. E esse ponto crítico pronto para destruir Gotham é Bane, um violento mercenário que monta uma base nos esgotos da cidade e arruma um exército de bandidões que não faria feio em uma escola de treinamento das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia. Aparentemente ele é o típico vilão que só tem planos de destruir tudo sem motivação, mas esse não é o caso. Tom Hardy cria o tipo de personagem que representa muito bem o medo. O olhar, o sensacional trabalho de voz (e ainda tem gente que questiona o motivo de se ver filmes legendados), os enquadramentos para tornarem o atual mais alto e assustador do que realmente é. Tudo contribui para uma cuidadosa criação da imagem destruidora e intimidadora de Bane – de forma tão bem feita que nos faz esquecer a participação patética do personagem que virou um balão inflável em Batman & Robin. Mais uma vez, Nolan utiliza o filme para apresentar temas que permeiam os noticiários do mundo todo. Não é difícil traçar paralelos entre a revolução ditatorial de Bane, com as guerrilhas que tomam o poder o poder em nome do povo. Bane é um terrorista ideológico, e por isso é um inimigo menos imprevisível como Coringa, dono de uma genial mente criminosa e capaz de espalhar a destruição onde pisasse. Sob o Coringa Gotham se tornou uma cidade do mais absoluto caos, com Bane ela se tornou um microcosmo sitiado e abandonado a própria sorte até mesmo pelo governo federal. É nessas condições que Batman retorna, como a última esperança de uma cidade. O embate entre ele e um vilão líder da criminalidade de Gotham é apoteótico e apocalíptico. Entre eles está a melhor adição do filme: Selina Kyle. Nolan mais uma vez utiliza sua dúbia sutileza ao nunca chama-la de Mulher-Gato, mas não há qualquer dúvida que é ela. Amoral, linda (ela conduzindo o batpod já entra para os grandes momentos do cinema) e uma enganadora de primeira, Selina é a personagem feminina que a trilogia precisava, após a fraca Rachel Dawes nunca realmente mostrar a que veio. E completa as novidades a presença de Joseph Gordon-Levitt como o policial John Blake e Marion Cotillard como Miranda Tate, com maior destaque para a capacidade de atuar do primeiro. Os fãs de quadrinhos vão delirar com as referências a Queda do Morcego, um arco de histórias memorável, mas que não consegue fugir a estirpe ter sido criada somente para encher os cofres da DC Comics, ainda sob o efeito entorpecido das vendas milionárias de A Morte de Superman. É aí que reside a principal qualidade do trabalho de Nolan: superar o trabalho original e dar a ele mais elementos, e não apenas se preocupar em filmar quadro-a-quadro o que consta nos gibis. É por motivos como esse que o trabalho do diretor à frente do Batman é a mais corajosa representação de um super-herói que já chegou aos cinemas. A trama é ágil, enxuta apesar de suas quase três horas. As misturas de ação, emoção e heroísmo são dosadas na medida certa, para nos preparar para o fim de uma das melhores obras cinematográficas dos últimos tempos. Mais uma vez, Nolan praticamente ignora os efeitos computadorizados, limitados às sufocantes perseguições aéreas com a principal novidade do arsenal do Batman: o Bat, praticamente um Tumbler voador, feito para guerra urbana. O espetáculo visual – com uma hora gravado no padrão IMAX, com películas de 70mm, ao invés dos tradicionais 35mm – é feito para ver em tela grande, apertando o braço da cadeira a cada diálogo cortante do Alfred, sem piscar os olhos quando Batman foge de uma saraivada de mísseis, vibrar quando a tempestade anunciada por Selina finalmente chega a Gotham. O Cavaleiro das Trevas Ressurge não é apenas um filme. Assisti-lo e analisa-lo isoladamente é um ato grotescamente falho – e por isso recomendo assistir novamente os dois filmes anteriores pouco antes de ver o filme. Ele é a conclusão de três grandiosos momentos que mostram a trajetória de uma lenda, de uma persona mítica que novamente foi inserida na mente de gerações, e que entra para um seleto panteão de inesquecíveis e poderosas lendas modernas. Com Christopher Nolan e sua Trilogia do Cavaleiro das Trevas, Batman mais uma vez ascende ao trono que é seu por direito: o de maior herói do planeta, dos quadrinhos e do cinema. Bem-vindo de volta. The Dark Knight Rises (EUA, 2012) Direção: Christopher Nolan Duração: 164 min Nota: 9,5