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Oitava parte do especial “Magia e Ocultismo para Iniciantes”

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Magia até o século XVIII era uma mistura de ciência e isolamento. Um mago não era um mago sem conhecer Física, Química, Linguística e diversas outras áreas de conhecimento. Mas Magia não era simplesmente conhecer ciências ocultas, mas sim participar de uma busca espiritual que integrasse o mago ao Universo ou a divindade estimada por ele. Não existia a prática mágica sem a busca pela transcendência desse mundo. Os que escapavam dessa tradição eram encarados como meros “feiticeiros”, que buscavam unicamente transformações na ordem das coisas terrestres, e não uma auto-transformação. Essa é a distinção básica – errônea e reducionista, a meu ver – entre a Alta Magia e Baixa Magia.

Existiam também necessidades subjacentes a essas obrigações. Eliphas Levi, por exemplo, fala em isolamento, dietas, privação de sono e celibato – obrigatórios pelo menos durante a iniciação do Mago, que deve percorrer um período mínimo de 40 dias, de franco isolamento. Abaixo, um excerto de Dogma e Ritual de Alta Magia no tocante ao assunto.

Um preguiçoso nunca será mago. A magia é um exercício de todas as horas e de todos os instantes. É preciso que o operador das grandes obras seja senhor absoluto de si mesmo; que saiba vencer as atrações do prazer, o apetite e o sono; que seja insensível ao sucesso como à afronta. A sua vida deve ser uma vontade dirigida por um pensamento e servida pela natureza inteira, que terá subordinada ao espírito nos seus  próprios órgãos e por simpatia em todas as forças universais que lhe são correspondentes.

Todas as faculdades e todos os sentidos devem tomar parte na obra, e nada no sacerdote de Hermes tem direito de estar ocioso; é preciso formular a inteligência por signos e resumi-la por caracteres ou pentáculos; é preciso determinar a vontade por palavras e realizar as palavras por atos; é preciso traduzir a idéia mágica em luz para os olhos, em harmonia para os ouvidos, em perfumes para o olfato, em sabores para a boca, e em formas para o tato; é preciso, numa palavra, que o operador realize na sua vida inteira o que quer realizar fora de si no mundo; é preciso que se torne um imã para atrair a coisa desejada; e, quando estiver suficientemente imantado, saiba que a coisa virá sem que ele pense por si mesma.

É importante que o mago saiba os segredos da ciência; mas pode conhecê-los por intuição e sem os ter aprendido. Os solitários que vivem na contemplação habitual da natureza, adivinham, muitas vezes, as suas harmonias e são mais instruídos, no seu simples bom senso, do que os doutores, cujo sentido natural é falseado pelo sofismas das escolas. Os verdadeiros magos práticos se acham quase sempre no sertão e são, muitas vezes, pessoas sem instrução ou simples pastores.

(…)

Aquele que quer entregar-se seriamente às obras mágicas, depois de ter firmado o seu espírito contra qualquer perigo de alucinação e temor, deve purificar-se, exterior e interiormente, durante quarenta dias. O número quarenta é sagrado, e até a sua figura é mágica. Em algarismos árabes, compõem-se do círculo, imagem do infinito, e do 4, que resume o ternário pela unidade. Em algarismos romanos, dispostos do modo seguinte, representa o signo do dogma fundamental de Hermes e o caráter do selo de Salomão: A purificação do mago deve consistir na abstinência das voluptuosidades brutais, num regime vegetariano e brando, na supressão dos licores fortes e na regularidade das horas de sono. Esta preparação foi indicada e representada, em todos os cultos, por um tempo de penitência e privações que precede as festas simbólicas da renovação da vida (LEVI, Eliphas, pag 196 a 198, versão em PDF).

Os benefícios de tais práticas são importantes, mas o próprio dogma obrigatório por trás deles torna muita coisa de suma importância até poucos séculos atrás, inúteis atualmente. E se a prática está na observação e os verdadeiros magos práticos em sua maioria são “pastores ou pessoas sem instrução”, pra que estudar? É esse tipo de contradição que está presente em parte das doutrinas mágicas dos séculos passados.

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Até o momento nessa coluna, vocês aprenderam a importância de submeter a Psique à mudanças fundamentais, a importância da respiração, da Visualização, de uma Filosofia Pessoal, da Sigilização, do Templo Astral, dos Servidores, e por aí vai. Eu achei pouca coisa de início, mas reli meus textos e cheguei a conclusão que escrevi o bastante para ligar o interruptor do interesse de vocês.

Também deve ter ficado claro que encaro a Magia como uma Ciência, uma Arte e Ferramenta, e não como uma religião ritualizada. Uma religião pode possuir uma porção ritualizada e mágica, mas a Magia está desvinculada de dogmas. Os dogmas são pessoais, e devem ser temporários e utilizados quando necessário. Por esse prisma, não existe necessidade dogmática, apenas resultados. Existem ordens que utilizam essa abordagem, como o Vodu Gnóstico – que retira toda a porção religiosa e substitui pela linguagem arquetípica. Essa também é a base da Magia do Caos.

Alguns, como Crowley (e os próprios caoístas), colocam os resultados em um pedestal intocável: não funcionou, você errou em algum ponto, ou não “movimentou energia suficiente para realizar o que você buscava”. Essa abordagem também me parece limitada: é necessário pensar que existem Forças muito maiores que nós na vastidão do Universo e talvez nossos feitiços se cruzem com a linha dos atos deles, o que pode explicar perfeitamente uma falha. Mais poder, implica em passar por cima de mais Forças, e aí por diante. Portanto, não coloque um resultado negativo como uma falha inteiramente sua. Às vezes pode ser interessante uma ou duas abordagens alternativas até para poder diversificar seus métodos.

No fim da parte 6 prometi ensinar como funciona detalhadamente uma Arma Mágica, e a utilidade do Templo Astral. Vamos lá que essa é a reta final da abordagem prática dessa coluna. Uma Arma Mágica é uma ferramenta de direcionamento psíquico/energético/espiritual. São como extensões astrais do seu corpo. Seu uso varia de acordo com o tipo de arma.

As básicas e suas correspondências foram listadas na parte 6: Adaga (Espada), Pentáculo (Moeda), Taça e Varinha (Baqueta). Essas armas devem de preferência ser confeccionadas pelo Mago e marcados por ele com sigilos pessoais e outros símbolos que os identifiquem. Elas devem ser postas em um altar pessoal e consagradas com um ritual de escolha do mago – geralmente uso incenso e marcações de sigilo para esse fim. Seu uso é similar a ferramentas muito próximas de profissionais experientes: o médico sempre usa o bisturi, um Jornalista uma caneta, um pedreiro o martelo, e por aí vai. Eles não precisam usar necessariamente o mesmo martelo a vida toda, mas é bastante provável que tenham apreço pela próprias ferramentas. Na Magia do Caos também existe a técnica de dar uma Arma pessoal para outra pessoa: o poder obtido com esse ato de desprendimento tende a ser maior do que toda a energia utilizada pela arma.

Reitero: caso possua as habilidades necessárias (não é meu caso, geralmente), produza suas próprias armas. Não precisa ser nada novo, comprado exclusivamente para esse fim. Um galho de árvore de uma árvore de 300 anos tende a ser energicamente mais poderoso (ou um melhor condutor de pacotes de informações ou ainda de rastros psíquicos) do que um galho “comum”. Existem também lendárias tabelas do poder secreto de cada espécies de árvore, utilizadas principalmente pelos galeses – se quiser mais detalhes, leia A Deusa Branca, do Robert Graves.

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Uma adaga serve para feitiços e magias relacionadas a linguística, e ao campo mental/intelectual. Serve para traçar sigilos astrais e na destruição de energias invasoras e reforço nos banimentos. Um ritual utilizando uma adaga, pode envolver o direcionamento de forças mentais a um alvo (simplesmente apontando a espada) ou proteção (o traçado de um pentagrama com uma espada ao centro, abaixo da cama em um quarto com atividade astral elevada).

Assim como todas as armas mágicas, uma adaga tem seu correspondente astral, guardada em seu Templo, que pode ser carregada em Sonhos ou Meditações e utilizadas com o mesmo poder de sua personificação física. O poder de uma Adaga pode ser reforçada no seu altar com o uso de outros símbolos, como Sigilos (úteis em quase todas as situações, como vocês já perceberam) e cartas de Tarot (cada naipe do Tarot está associado a um elemento, e consequentemente, a uma arma mágica), que podem ter o poder combinado através de um ritual simples – consagre as duas ao mesmo tempo com um incenso, por exemplo – ou algo mais elaborado, sincronizado com dias da semana e horas planetárias.

O Pentáculo/Moeda está ligado a vida terrena, especialmente a riqueza e estabilidade. Andar com um pentáculo especial na carteira amplia o poder dela de atrair dinheiro – encarar o dinheiro como uma entidade espiritual e a sua carteira como um dispositivo para atrai-lo, prende-lo e libera-lo quando necessário, pode ampliar os poderes dela – assim como consagrar um amuleto do gênero e deixar em sua mesa de escritório. Pentáculos são amuletos poderosos de proteção, relações sociais. Imprimir o poder dessas armas em seu Inconsciente através de um ritual de Gnose pode ser de grande ajuda.

Uma vez sonhei que estava dormindo em um local em que realmente dormiria daqui a uns cinco dias. No sonho, Eu acordava e era atacado por uma série de entidades sinistras e barulhentas – bem similares aos wraiths, de The Witcher 2, game que conheceria mais de um ano depois. O ataque não durou muito tempo: Eu retirei um pentáculo que estava embaixo do meu travesseiro e realizei um banimento, utilizando o mantra doTetragrammaton (vão no Google, porque tem tudo a ver com Elementos e Armas Mágicas). Funcionou.

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A baqueta/varinha é o símbolo da espiritualidade, da Vontade Mágica. Se a Adaga envolve “cortar” energias, o Pentáculo em arregimenta-las/rebate-las, a Baqueta as lança. É mais ou menos como nos clássicos usos da Varinha em esteriótipos de bruxas, e nos filmes do Harry Potter: apontar, desenhar um movimento e esticar o braço. Às vezes combinado com uma ou duas palavras de poder.

Já a Taça é um elemento bem raro de ser utilizado em rituais ordinários. Está relacionado a invocações (lembra da Bíblia dizendo que uma Besta sairá do mar? O significado está relacionado a um poder espiritual e temperamental, enquanto a besta que saiu da terra se relaciona a um poder financeiro/social) de entidades específicas, que se relacionam com o líquido que pode ser colocado na taça.

Todas essas armas têm relação com o Astral, e devem ter lugar especial em seu Templo – isso pode ser feito simplesmente através de técnicas de visualização, reforçadas periodicamente, conforme informei nos textos passados. Meu altar possui armas completamente diferentes dessa simbologia, por motivos bem pessoais e sincrônicos. Tenho o costume de comprar lembranças em lugares que viajo, sempre com o pensamento: o que posso comprar aqui que provavelmente não encontrarei em lugar nenhum. Após um certo número de viagens, me mudar de casa e arrumar meus adereços mais legais (coincidentemente, quatro) em cima de uma cômoda, coloquei os quatro dispostos em forma de quadrado e percebi que estavam alinhados com os quatro elementos. Se tornaram minhas Armas Mágicas.

Mas pra que isso? Pra que e por que praticar ou dizer praticar magia?

Como disse, Magia é uma ferramenta e um processo. Os motivos que o levam a testa-la dependem quase unicamente de você. Alguns se sentem simplesmente atraídos e experimentam sem qualquer motivo claro ou objetivo traçado. Outros querem achar atalhos para ganhos materiais, enquanto outros buscam conhecimento, Outros ainda querem controlar entidades poderosas para impressionar os inimigos (e amigos, ou possíveis namoradas).

Tudo isso pode ser alcançado através de Magia. É a mesma dualidade da Ciência que mata de forma silenciosa com uma arma química como o Fentanil, mas também salva milhares de vidas com curas para milhares de doenças. A ideologia da Ciência é um conceito pessoal, ou presente dentro da nação onde ela opera. A Magia simplesmente estuda e utiliza fenômenos que não foram observados com regularidade e rigor necessários para se tornarem ciência formal. Da mesma forma que na Magia, a Ciência possui toneladas de Teorias sem comprovação experimental, que possuem o papel de saltos filosóficos que guiam e preveem os próximos passos dela. Magia é a ciência da subjetividade, sem comprovação empírica externa ao mago.

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Um estudante dedicado e obstinado de Magia pode seguir manuais prontos e chegar longe sem qualquer avanço filosófico ou evolutivo. Mas é preciso entender que geralmente se está sozinho nesse mundo. Magia é algo subjetivo, e mesmo em grupos, ordens e irmandades, um mago é alguém solitário e não exporá certos experimentos realizados por ele. Por isso a necessidade de conhecimento filosófico e teórico. Mais cedo ou mais tarde, seus atos reverberarão e chamarão a atenção de outros praticantes e entidades.

No mundo mágico não existem leis claras, não existe física, termodinâmica, polícia. Existe Caos e Experimentação. Por essa série de motivos as quatro qualidades do mago são: Saber, Ousar, Querer e Calar (leia os princípios novamente, e faça as correspondências entre os elementos e armas listados acima). Essa nova realidade subjetiva bastante ampla é um atrativo para alguns e inspira medo em outros. Se você está no segundo grupo, é melhor se contentar com a Teoria, que já é por demais excitante.

Na próxima parte: livros e mais livros!

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No Comments

  1. Jack

    21 de março de 2013 at 11:53

    Ótimo texto, trouxe algumas lembranças da minha adolescência. Pratiquei magia durante um tempo. Li alguns livros de Eliphas, Papus e Crowley. Fui membro da gnose por uns 2 anos. Realizei algumas viagens astrais bem interessantes. Tive alguns resultados significativos no campo do magnetismo animal. Mas tudo isso me parece bem distante agora. Uma das coisas que mais me fascinava no Crowley era o fato dele praticar o montanhismo, pois sou montanhista e considero o cume de uma determinada montanha perto da minha cidade meu lugar mágico. Quando estou lá em cima mudanças significativas ocorrem em minha psique e no modo como enxergo o mundo. Continue escrevendo.

    Reply

  2. Filipe Siqueira

    21 de março de 2013 at 11:59

    Também fiquei na Gnose do Samael quase dois anos. Apesar de algumas coisas interessantes, como o ensino da Kabbalah e o foco em viagens astrais, não considero um bom lugar para o aprendizado, principalmente depois que você sai da fase de novato.

    Mas talvez minha opinião é uma questão de foco: eles são muito pouco práticos (ao menos o grupo que participei), é muito blábláblá, parece aula do Bardon, que pra ensinar alguma coisa manda 1243872387872 recomendações (embora ele fosse um excelente mago… só era um professor bem mais ou menos).

    E não se preocupe, mais cedo ou mais tarde a Magia volta ao seu caminho – provavelmente quando estiver no cume de uma montanha.

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  3. john

    14 de setembro de 2013 at 11:22

    me fala o que vc acha dos mestiços como o lobisomem

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  4. Dan

    18 de setembro de 2013 at 14:51

    Olá, gostaria de saber se é possível gravar um sigilo em uma baqueta, para carregá-la de algum poder em particular para usar de forma permanente.

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    15 de janeiro de 2016 at 11:02

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